Rita Kramer, prazer. E sempre que você vir um texto em terceira pessoa por aqui, ele será meu. Obrigada.
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Sua casa poderia ser concebida como um lar “normal”. Afinal, nela havia uma sala, três quartos, uma cozinha, três lavabos e dois Pais. Era mais ou menos isso. Os pais faziam parte da decoração, de modo que era notável a harmonia entre os entes e a mobília, algo com um efeito em cores pastéis.
Milinkoi era uma pessoa do tipo que chamaríamos de bizarra. A bizarrice fazia um périplo ao redor de toda a sua existência, desde o dia em que nascera. Vinte e nove de fevereiro.
Nascer em vinte e nove de fevereiro é um fato bizarro, mas poderiam discordar: nem tanto. O que tem demais em fazer aniversário de quatro em quatro anos?
Na maternidade, acharam que o menino tinha trissomia no cromossomo vinte e um, quando na verdade ele somente tinha os olhos um pouco rasgados por conta de sua tia-avó de terceiro grau, que era de alguma ilha esquisita no oriente.
Irrelevante toda essa descrição do nascimento desse rapaz. Ele não era filho de nenhum ator hollywoodiano; não morava na África e não foi, assim, salvo da inanição por nenhum ator hollywoodiano; muito menos era herdeiro de títulos inúteis de nobreza europeus. Ele era mais um ser insignificante chegando a esse baixio das bestas, e o que ele podia fazer para ser diferente?
Quando era criança, Milinkoi não gostava de ir ao recreio na escola. Adendo este fato a seu pânico de crianças histéricas, ele tinha medo de que os colegas pedissem o seu lanche.
Os outros garotos pareciam não se contentar com o que era deles, e Milinkoi destestava dividir o que era dele. É óbvio que nessa relação havia um conflito grave de interesses, de modo que isto resultava em: a) alguns meninos falando compulsivamente sobre jogos eletrônicos e comendo os lanches um dos outros; b) um outro garoto sozinho pensando sobre o vôo das baratas e comendo o seu lanche. A sociedade tem dessas coisas.